Raduan III


Dois outros textos do livro [Menina a Caminho], Hoje de madrugada e O ventre seco, de 1970, escavam com palavras exatas as feridas de amores findos. O brevíssimo Aí pelas três da tarde, de 1972, relembra sem citar a redação do extinto semanário paulistano Jornal do bairro, fundado por Nassar e seus irmãos em 1967, numa empreitada jornalística que teve importante papel político e cultural. No último conto de Menina a caminho, o irônico e impiedoso Mãozinhas de seda, escrito em 1996 para o segundo volume dos Cadernos de Literatura Brasileira, do Instituto Moreira Salles, dedicado ao escritor, mas não publicado a seu pedido, Raduan Nassar observa as mãos de "certos intelectuais", notando que muitos deles parecem fazer o uso intensivo da pedra-pome. "Eruditos, pretensiosos e bem providos de mãozinhas de seda... Mas sem rosto e entregues a um rendoso comércio de prestígio, um promíscuo troca-troca explícito, a maior suruba da paróquia." O auto-exílio literário do escritor parece lembrar o pacto realizado em O ventre seco, num acordo quase perfeito com o mundo. "Em troca do seu barulho, dou-lhe o meu silêncio", diz o narrador. Um silêncio eloquente, no caso de Raduan Nassar.

Fonte: Revista Istoé, 9.7.97

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